Sobre a madrugada de Terça

Eu tava triste,Tristinho!
Mais sem graça que a top-model magrela na passarela
Eu tava só, Sozinho!
Mais solitário que um paulistano
Que um canastrão na hora que cai o pano
Tava mais bôbo que banda de rock
Que um palhaço do circo Vostok...

Mas ontem eu recebi um Telegrama
Era você de Aracaju ou do Alabama
Dizendo: Nêgo sinta-se feliz
Porque no mundo tem alguém que diz:
Que muito te ama!
Que tanto te ama!
Que muito muito te ama,
que tanto te ama!...

Por isso hoje eu acordei com uma vontade danada de mandar flores ao delegado,

De bater na porta do vizinho e desejar bom dia

De beijar o português da padaria...


Telegrama - Zeca Baleiro


COMIDA CHINESA II


Quando deram conta, eram apenas quatro. Ouvindo mais dele, do que conversando propriamente. Foi aí que veio a sugestão: Comida Chinesa.

Os dois colegas rejeitaram prontamente. Adeptos da praticidade e modernidade do FastFood, decidiram ir em busca do MacDonalds sagrado.

Ela, como sempre estava disposta a experimentar coisas novas. Adorava o misto de sabores que o mundo lhe oferecia. Nunca recusaria experimentar algo novo. Quando aceitou, o viu sorrir um sorriso inesperado. Estranhou, mas sorriu também. E saíram para o MaoTai.

Ele parecia conhecer o terreno em que pisava: Mostrava-lhe os pratos, dizia do que eram feitos. Com alguns, até explicou a forma de preparo.

Apesar de estar disposta a conhecer e experimentar cada sugestão, ela confessou que a aparência de alguns pratos não lhe eram convidativas. Mas ele, já entrosado com os garçons e conversando sobre camarões, lulas, verduras e cações, disse a ela que não se preocupasse. Que apenas experimentasse para ter uma opinião. Se não gostasse, ao menos seria por conhecimento de causa.

Diante do argumento, serviu-se. O prato era colorido e composto de muitos frutos do mar. Havia algumas coisas que ela já conhecia, e sabia ter o gosto agradável, como o rolinho primavera. Mas não contou isso a ele.

Quando ia comer, ele pediu que esperasse um pouco. Pediu algo para beber. Após a saída do garçom ele disse para ela fechar os olhos. E num gesto automático ela fechou.

“Uma das melhores experiências que eu já tive na vida foi mergulhar. Quando eu era criança, quase morri afogado e passei a vida toda com medo de água. Mas sempre tive espírito aventureiro. Em minhas viagens, fiz trilhas, bungee jump, parapente, escalada... mas nunca tive coragem de entrar na água. Mas um dia conheci alguém que me perguntou se eu não gostaria de ao menos tentar. Se eu não gostasse, ao menos seria por conhecimento de causa. Foi quando eu conheci o mundo submarino e a sensação de estar viajando no espaço com seres extraterrestres. Foi mágico. Foi lindo e eu não tive nenhum medo. Mas eu pensava que a segurança do cilindro me fazia não temer. Quando voltamos para o barco, eu consegui entrar na água e percebi que estava curado. E mais tarde, aprendi a nadar. Hoje, mergulho é o meu esporte favorito.”

Abra a boca, ordenou. Assim mesmo, sem pausa entre a história comovente e a imperatividade da ordem. Ela abriu e ele colocou um pedaço de qualquer coisa com gosto diferente nela. Então, ela abriu os olhos. Ele não a olhava, apenas comia. Quando terminou perguntou o que era e disse que aquilo tinha um gosto familiar.

Ele respondeu que não era o que ela havia comido antes que tinha gosto daquilo. E sim que aquilo era o gosto que ela precisava reconhecer. Agora ela já sabia. A partir dali, quando comesse algo poderia dizer ‘isso parece comida chinesa’.

O jantar foi maravilhoso. De conversas inesperadas e novas sensações. Algumas frases que não seriam esquecidas. Ele dizendo que ela era muito jovem e precisava experimentar o mundo, senão nunca poderia realmente saber do que gosta. Um convite.

E depois de muitas sensações diferentes, se despediram e ela foi para casa.

Comida Chinesa I


Era terça-feira. Ela saiu apressada, com medo de perder o ônibus confortável e gratuito que lhe poroporcionava uma ida divertida à faculdade. Seus colegas sempre tinham algo diferente para fazer durante a viagem. Isso lhe dava muito ânimo para continuar estudando: as companhias.

Enfim, depois de muito esperar um transporte que custava a chegar, conseguiu chegar ao local de embarque três minutos antes do ônibus partir. ‘Que sorte’, pensou. Por esse motivo, agradeceu em silêncio, mesmo sem saber ao certo à quem.

Infelizmente não conseguiu lugar ao lado dos colegas, que sempre sentavam no fundo – local de muita conversa . Sentou-se então, na primeira cadeira, ao lado de uma desconhecida mocinha que estudava com a luz ligada e ouvia algo em seu mp3.

Na falta de assunto, virou para o lado e dormiu. Uma hora e meia mais tarde, como que desperta por um relógio interno, acordou já em frente à faculdade. Levantou primeiro que todos e desceu.

Subindo a rampa de acesso, não sem antes beber uma generosa quantidade de água, chegou em frente à sala de aula. Para sua surpresa, estava fechada. Decidiu esperar por quinze minutos, enquanto revezava-se entre MSN e ligações no celular. Ninguém apareceu.

Foi à biblioteca constatar se não havia alguém para socorrer-lhe. Encontrou toda a turma animada, meio sem ter o que fazer e alguém lhe informou que não haveria aula.

Imediatamente veio à mente o esforço que havia feito para estar ali, levando em conta que saiu apressada de casa para não perder o horário e vestiu uma roupa qualquer, sem muita produção. Nem havia usado maquiagem.

“Cinema!” Foi a sugestão de alguém. Ela não poderia. Não daria tempo de voltar a tempo de não perder o transporte. “Praia!” Praia? Gargalhada geral perante a sugestão. “Então, shopping mesmo”. Se o dia fosse sexta-feira ninguém titubearia em pensar num barzinho à beira mar ou numa casa de shows. Mas, ‘shopping mesmo’ era uma boa opção. E partiram.

Passearam por algumas lojas rindo muito e conversando alto. Alguns decidiram partir, outros foram ao cinema. O restante estacionou na praça de alimentação e desataram uma conversa sobre novas experiências. Sobre sensações e coragem.

Ela pouco dava opinião. Sabia que sua opinião levantava sempre novas discussões e preferiu calar-se. Mas ele percebera seu silêncio. Então fazia-lhe perguntas diretas. Mas ela continuava com respostas vagas.


(Continua...)